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“Mayday, Mayday, Mayday” - Guia para comunicações de emergência na aviação - Parte 1

Por Comandante Bassani - ATPL/B727/DC10/B767 - Ex-Inspetor de Acidentes Aéreos SIA PT. voopessoal@gmail.com  - Jan/2025 https://www.personalflyer.com.br/



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Hoje, voar é mais seguro do que nunca. Seja em uma aeronave de treinamento de dois lugares, um helicóptero comercial de quatro lugares, um microlight de um lugar, ou um Airbus A380 com quase 500 passageiros e tripulantes, a atenção dada à segurança na aviação nunca esteve tão alta. No entanto, como em todas as atividades, voar não pode e nunca será 100% seguro. Embora a segurança possa ser maximizada dentro dos parâmetros da atividade sendo realizada, os riscos envolvidos ao lançar objetos mais pesados que o ar no céu, muitas vezes com centenas de passageiros a bordo, nunca podem ser completamente erradicados.


Mas o que fazer se algo der errado? Todos os dias, aeronaves de diferentes tipos e tamanhos enfrentam eventos de emergência. Alguns desses eventos podem ser menores, enquanto outros podem colocar em risco a segurança do avião e de todos a bordo.

Pilotos são treinados regularmente para lidar com incidentes que possam ameaçar a aeronave. Quer sejam de natureza técnica ou devido a algum outro evento adverso durante o voo, os pilotos estão bem-preparados para lidar com esses tipos de eventos, tanto no ar quanto no chão.


Além de lidar com qualquer emergência que ocorra, os pilotos são treinados para buscar assistência assim que uma situação dessas se apresentar. O modo tradicional de comunicação entre aeronaves e controladores em solo é via rádio de frequência muito alta (VHF). Em caso de emergências em voo, isso abre um modo de comunicação que, para o ouvido não treinado, pode parecer um idioma estrangeiro.


Neste artigo, irei conduzi-los pelo universo das comunicações de emergência na aviação, desde mensagens de rádio até outras formas de buscar assistência dos que estão em solo.

Então, à medida que decolamos, certifique-se de que seu cinto de segurança esteja apertado e prepare-se para aprender mais sobre - como os pilotos podem comunicar que seu voo pode estar enfrentando problemas adversos ou imprevistos para os quais é necessário ajuda.


Aviate, Navigate, Communicate


Não deve surpreender que o primeiro treinamento dos pilotos para casos de emergência é manter o controle da aeronave ou 'aviate'. Ao contrário dos filmes de Hollywood, onde a tripulação salta direto para o rádio como se isso fosse resolver magicamente o problema, os pilotos são treinados para manter o controle da aeronave pelo maior tempo possível. Diagnosticar o problema e resolvê-lo deve sempre ter prioridade sobre simplesmente informar alguém pelo rádio.


Se a tripulação conseguir manter ou recuperar o controle da aeronave, o próximo item da lista mental de qualquer aviador é manter a consciência da localização, rumo e altitude ou 'navigate'. Se o evento de emergência tiver desviado a aeronave de seu curso, retornar a esse curso ajuda a tripulação a recuperar a consciência situacional e retornar ao perfil de voo planejado após da decolagem.


Com a condução da aeronave e a conscientização da localização (rumo, altitude e arredores) estabelecidos, é nesse ponto que os pilotos são treinados para usar o rádio para enviar uma mensagem de socorro e buscar assistência do controle de tráfego aéreo (ATC) - 'communicate'.


Deve ser mencionado que acidentes aéreos muitas vezes ocorrem sem que chamadas de emergência sejam emitidas pela tripulação. Isso geralmente ocorre porque eles estão usando o tempo disponível para passar pelas duas primeiras etapas do procedimento acima – aviating e navigating. Afinal, a natureza humana dita que, se você se encontra em uma situação perigosa, tente gerenciar a situação antes de qualquer outra coisa aconteça.


Comunicar a situação ainda é um elo vital na cadeia de emergência em voo. Comunicar o que está acontecendo pode significar que alguém na empresa aérea, pode oferecer assistência e resolver o problema, ou que os controladores de tráfego aéreo podem direcionar você para um lugar seguro (como um aeródromo alternativo).

Tragicamente, também pode significar que os socorristas saibam onde procurar a aeronave caso não consiga pousar em segurança. Pode, ainda, possibilitar que investigadores de acidentes entendam o que aconteceu durante o voo para evitar que o mesmo ocorra com outras pessoas.

Mas como as tripulações de voo comunicam em momentos de emergência? Existem duas maneiras principais de comunicar uma emergência em voo pelo rádio – uma chamada 'Pan-Pan' ou uma chamada 'Mayday'. Mas o que esses termos significam e quais são as diferenças entre eles?


Transmissões de rádio em emergência


Ao enfrentar uma situação inesperada a bordo de uma aeronave que pode afetar a segurança do voo, os pilotos têm duas opções para transmitir a gravidade da situação para o ATC. A indústria global da aviação depende do uso das duas frases-chave mencionadas acima, e embora sejam semelhantes na função, diferem sutilmente em significado.

Para orientação sobre as principais diferenças, podemos citar a Federal Aviation Administration (FAA), e a Seção 6-3-1 de seu Aeronautical Information Manual (AIM), que descreve as comunicações de emergência e urgência:

“A comunicação inicial, e se considerado necessário, qualquer transmissão subsequente por uma aeronave em emergência deve começar com o sinal MAYDAY, de preferência repetido três vezes. O sinal PAN-PAN deve ser usado da mesma maneira para uma condição não crítica.


As comunicações de emergência têm prioridade absoluta sobre todas as outras comunicações, e a palavra MAYDAY comanda o silêncio de rádio na frequência em uso. Comunicações urgentes têm prioridade sobre todas as outras comunicações, exceto emergências, e a palavra PAN-PAN avisa outras estações para não interferirem com transmissões urgentes.”


‘Pan-Pan’ (frequentemente referido simplesmente como uma 'chamada PAN') é uma abreviação da frase em inglês 'Possible assistance needed' (Possível assistência necessária). Uma chamada PAN é usada para comunicar uma situação urgente, mas não crítica, que afeta um voo. Enquanto as chamadas Mayday indicam que a tripulação precisa de assistência imediata, uma chamada PAN indica que há uma situação urgente, mas que a tripulação não precisa de assistência ou intervenção imediata do ATC.


Exemplos de quando uma chamada PAN pode ser feita incluem a perda de um instrumento, um piloto ficando indisposto (mas não incapacitado), ou um problema técnico que significa que o voo não pode continuar e precisa ser desviado. As chamadas PAN indicam um problema sério, mas não ameaça à vida, a bordo de um voo que a tripulação está tentando diagnosticar e resolver, se possível.

O raciocínio por trás das chamadas PAN é colocar o ATC em alerta sobre o problema e oferecer assistência, caso necessário. As chamadas PAN também podem ser atualizadas para uma Mayday caso a situação se agrave e se torne crítica para a segurança do voo. Isso contrasta com as chamadas Mayday, nomeadas pela frase francesa ‘m’aidez’ que significa ‘ajude-me’. Uma chamada Mayday indica uma emergência urgente que está impactando imediatamente a segurança do voo e daqueles a bordo. Exemplos disso incluem a perda de um motor em uma aeronave bimotora, incapacitação do piloto ou um incêndio (ou suspeita de incêndio) em algum lugar da aeronave.


As chamadas Mayday atraem imediatamente a atenção do ATC, que pode oferecer soluções e analises como o aeródromo para desvio mais próximo, se um pouso de emergência for necessário. Também pode desviar outros tráfegos aéreos em volta da aeronave afetada, para que ela tenha prioridade para onde precisa ir e também pode convocar serviços de bombeiros e resgate no aeroporto e assistência médica, para atender a aeronave após sua chegada, se necessário.

Se o ATC não puder ajudar, a tripulação será transferida para outro centro alternativo que possa oferecer mais assistência.


Estudo de caso: Aviate, Navigate, Communicate


No caso do voo US Airways 1549, conhecido como "O Milagre do Hudson", o comandante Chesley "Sully" Sullenberger e o primeiro oficial Jeffrey Skiles aplicaram os princípios de Aviate, Navigate e Communicate, refletindo um excelente profissionalismo. Após uma colisão com aves causar a falha de ambos os motores logo após a decolagem de Nova York (JFK), eles se concentraram em manter o controle da aeronave (aviator). Simultaneamente, navegaram em direção ao rio Hudson como uma opção de pouso segura (navigate), e comunicaram sua situação ao ATC garantindo uma resposta rápida de resgate (communicate). Este caso é a personificação da comunicação eficiente em situações de emergência, validando o procedimento universalmente adotado "Aviate, Navigate, Communicate".


Regulamentos: FAA, ICAO, EASA & SKYbrary


FAA

Como estipulado pelo Aeronautical Information Manual (AIM) da FAA, a ênfase na distinção clara entre comunicações Pan-Pan e Mayday garante que o nível apropriado de urgência e priorização seja mantido em emergências, prevenindo a má comunicação e assegurando uma resposta rápida.


ICAO

A International Civil Aviation Organization possui procedimentos globais de "Mayday" e "Pan-Pan", detalhados no Documento 4444, Procedures for Air Navigation Services – Air Traffic Management (PANS-ATM). A identidade global da ICAO assegura que as práticas de comunicação de emergência são uniformemente aplicadas em todas as regiões, promovendo a gestão harmonizada e eficiente das emergências no céu.


EASA

A European Union Aviation Safety Agency também faz eco aos regulamentos da FAA e ICAO. A EASA se certifica de que os operadores na Europa estejam aderindo aos padrões internacionais de segurança. O Parte-CAT - Operações de Transporte Aéreo Comercial representa os requisitos necessários para operações comerciais com aeronaves

Demonstrando como práticas como "Aviate, Navigate, Communicate" são incorporadas em instruções mandatórias, reforçando a otimização de medidas com o desenvolvimento de um plano padrão de respostas para todos os tipos de aeronaves na Europa.


SKYbrary

Como um repositório de conhecimento crítico, SKYbrary oferece uma plataforma centralizada que abrange todos os aspectos da segurança na aviação. Ele fornece aos profissionais da área recursos abrangentes sobre comunicações de emergência e protocolos da FAA, ICAO e EASA. SKYbrary mantém a comunidade de aviação informada sobre as melhores práticas, estudos de caso e lições aprendidas para garantir que "Aviate, Navigate, Communicate" seja um mantra fundamental sob qualquer condição de emergência.



“Mayday, Mayday, Mayday” – Guia para Comunicações de Emergência na Aviação – Parte 2 - continua na próxima semana.





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